Canção Doce, de Leïla Slimani
DA PERTURBAÇÃO À PERDA DE CONTROLO Myriam e Paul vivem em Paris e são um casal de classe média: ela, advogada; ele, produtor musical. Quando engravida pela primeira vez, Myriam deixa de trabalhar para cuidar de Mila; já com o nascimento de Adam, o filho mais novo, Myriam, sufocada, sente vontade de regressar ao mundo laboral. E assim surge Louise, a ama que encanta a todos, agregando a si o protótipo da perfeição, ao cuidar da casa, das crianças: «Louise se supera na arte de se tornar invisível, e, ao mesmo tempo, indispensável.» «Olham para ela e não a vêem. É uma presença íntima, mas nunca familiar.» Aqui, e em outras referências, apercebemo-nos da força da barreira social no trato e nos gestos. Não obstante a crescente relação de dependência na arquitetura familiar, Louise será sempre a empregada e Myriam e Paul, os patrões. O final é-nos apresentado logo nas primeiras três páginas, com uma primeira frase de três palavras, que, sem preâmbulos, choca. Apesar do horror descrito,