O quarto de Giovanni, de James Baldwin

 



OPINIÃO DE LEITORA: SOBRE O MEDO E A VERGONHA DE SE ASSUMIR O QUE SE DESEJA

«Queria a mesma cama à noite e os mesmos braços e queria acordar de manhã sabendo onde estava. (...) Já assim fora uma vez, antes; já quase assim fora uma vez, antes. Podia torná-lo real. Só me seria necessária uma força breve e intensa, para voltar a ser eu próprio outra vez.» (p. 120)

Em Nova-Iorque (EUA), nos anos 1950, ser-se homossexual era considerado crime. O mesmo não sucedia em Paris (embora França desaprovasse este comportamento), cidade escolhida por David, o protagonista e narrador desta história, para se refugiar. Determinado a «encontrar-se a si mesmo», David pede Hella em casamento que, por sua vez, decide embarcar numa viagem até Espanha, a fim de tomar uma decisão sobre o futuro e o destino de ambos.

Sem nenhum franco na sua posse e deambulando pelo ambiente boémio daquela cidade francesa, David conhece, através do homem a quem pede dinheiro emprestado, Giovanni, um jovem barman e emigrante italiano que, sabendo da sua situação, o convida a viver com ele no seu pequeno e modesto quarto, localizado na periferia de Paris.

Atraído e seduzido pela intensidade de Giovanni, David, apesar de usar amiúde adjetivos como «vergonha» e «nojo» para classificar e, assim, negar o que sente, entrega-se a esta paixão, vivendo com Giovanni durante alguns meses um relacionamento que terminará logo que Hella, a noiva, regresse de terras espanholas. O simbolismo atribuído ao quarto reflete o grau de intimidade que se estabeleceu entre estes dois homens.

Em «O quarto de Giovanni», James Baldwin apresenta-nos uma narrativa com um estilo de escrita direta, depurada, mais sugestiva do que explícita (trata-se de um livro publicado pela primeira vez em 1956) e com algumas passagens líricas, sobretudo nos diálogos.

Ao longo da leitura, senti-me envolvida pela personalidade emotiva e absorvente de Giovanni e pelo passado traumático que carrega. Já David intrigou-me pela sua complexidade e capacidade de compartimentar os seus sentimentos, de ser ambíguo (e até) contraditório nas suas ações.

O desfecho trágico que conhecemos nas primeiras três páginas não retira a vontade de continuar a ler este livro. Percebe-se bem o porquê de se ter tornando numa referência na Literatura LGBT.

Leitura feita para o Clube Livrólicos Anónimos, dinamizado pelo @na.cama.com.os.livros e pela @silveria.miranda.

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