Águas Passadas, de João Tordo
Trata-se do segundo thriller policial de João Tordo, cuja trama ocorre em janeiro de 2019, debaixo de uma chuva torrencial que não cessa durante treze dias. A frase «O que os olhos não vêem, o coração não sente.» ilustra a brutalidade dos crimes que resultaram na morte de dois adolescentes — a primeira vítima, uma rapariga de quinze anos, é encontrada deitada na areia da praia de Assentiz; o segundo corpo, o de um rapaz de dezassete anos, é descoberto na floresta de Monsanto.
Pilar Benamor, subcomissária da PSP de Cascais, e Cícero Gusmão, um ex-informador da polícia que se refugia numa casa situada perto do Santuário da Peninha, são os primeiros a serem confrontados com este cenário sinistro, de contornos obscuros. Juntos, irão desvendar alguns dos segredos mais incómodos e perturbadores cometidos por uma franja da sociedade que se considera imune ao deter o poder político, social e financeiro.
«Planear o Mal era um processo refinado, só ao alcance de certas pessoas que, pelas suas características invulgares, conseguiam atravessar a fronteira entre o suportável e o pesadelo, de maneira que, fazendo coisas monstruosas, permaneciam, ainda assim, humanas. E ela não sabia se era capaz disto — se, no fundo, a sua exagerada sensibilidade a impedia de compreender o homicida que perseguia.»
Pilar é uma mulher obstinada, filha do falecido intendente Benamor, que não obstante o ambiente machista que impera a esquadra onde trabalha, luta por conquistar o seu lugar na PSP. Já na esfera privada, ela vê-se confrontada por um problema sério de adição, aprisionada numa espiral de sucessivos comportamentos compulsivos de risco e por um passado carregado de fantasmas.
Numa atmosfera melancólica e decadente, o autor explora os padrões de funcionamento disfuncionais — mas difíceis de quebrar — das personagens, que são levadas ao limite, como se a esperança de mudança adviesse do momento em que uma pessoa bate no fundo do poço.
Outro aspeto interessante são os pontos de vista escolhidos para narrar esta história, contada, sobretudo, na terceira pessoa, e intercalada — incluindo o início e o final do livro — pela voz de Cícero, que ocupa um lugar de destaque no enredo, não só pelo papel que assume na investigação, como também pelas considerações de teor filosófico que imprime à narrativa, com referências a Tolstoi. «Quem me dera perder a memória. Que tudo fossem fósseis, perdidos na antiguidade do mundo. Que tudo fossem águas passada.»
O leitor consegue facilmente, através de uma escrita fluida e cinematográfica, imaginar os cenários descritos e os diálogos entre as personagens, sendo estes alguns dos pontos fortes deste livro de género que em nada é menor quando comparado com os publicados pelos países nórdicos.
Susana
Barão
O prometido é devido e por isso aqui estou eu. Em Setembro vou ler este livro e só ainda não o li, porque combinei ler com outras meninas. Beijinhos
ResponderEliminarOlá, Carlinha! Mesmo sendo um livro extenso (ultrapassa das 500 páginas), a sua leitura acaba por ser fluida e rápida. Obrigada pelo teu carinho e apoio. Beijinhos
EliminarSó li um livro do João Tordo, "O bom inverno" e não fiquei fã. Desde aí, não voltei a ler mais nada.
ResponderEliminarPela tua opinião, este parece valer a pena.
Olá, Silvana! Parti para esta leitura sem expectativas, e no fim senti que cumpriu o seu propósito, ou seja, o de entreter e proporcionar uma boa experiência. O interessante neste livro é aliar a investigação dos crimes ao lado mais obscuro das personagens, abordando temas complexos e algo incómodos. Na minha ótica, é um bom livro de género que em nada fica atrás se for comparado com que é publicado noutros países, como o caso da Suécia por exemplo.
EliminarMais um livro que me suscitou curiosidade e vontade de ler. Obrigada, Susana x
ResponderEliminarObrigada, Teresa, pelo incentivo e o teu interesse. Beijinhos
Eliminar