A Casa dos Espíritos, de Isabel Allende

UMA SAGA FAMILIAR IMPOSSÍVEL DE SE ESQUECER

«A minha avó escreveu durante cinquenta anos nos seus cadernos onde registava a vida.»

As memórias de Clara, uma mulher delicada, espiritual e decidida, capaz de prever algumas das mais importantes tragédias que se abatem sobre a família Trueba, compõem parte da matéria-prima necessária para relatar aquela que foi a história de vida de três gerações: Clara (mãe) e Esteban Trueba; Blanca (filha) e Pedro Tercero García; Alba (neta) e Miguel.

Apesar de nunca mencionado ao longo do texto, tudo o que é descrito baseia-se em acontecimentos verídicos ocorridos no Chile do século XX (como o Sismo de Valdivia), culminando com a queda do presidente Salvador Allende (referido com outro nome) e a instauração de uma ditadura militar, em 1973, com a ascensão de Pinochet.

Esteban Trueba, proprietário da fazenda Las Tres Marías, é um homem complexo e autoritário, que trabalhou com afinco para erguer aquele que foi o seu maior projeto de vida; inicialmente noivo de Rosa, é com Clara que acaba por se casar, nutrindo por ela um amor obsessivo. De todas as personagens, Trueba é, no meu entender, aquela que sofre a mais significativa transformação ao longo do enredo, a ponto de ser possível sentir compaixão por alguém que tanto mal conseguiu infligir nos outros, nomeadamente àqueles que lhe eram mais próximos.

A grande mestria de Isabel Allende com esta sua primeira obra reside, sobretudo, na construção das personagens e na riqueza e densidade do enredo, elaborando um retrato muito completo do contexto sociopolítico daquela época. Não existem pontas soltas: tudo se interliga e cada pormenor conta para a compreensão dos factos.

Adiei por anos a leitura desta saga, por acreditar que estaria demasiada imbuída em detalhes espirituais; contudo, agora compreendo a necessidade da sua inclusão, ao equilibrarem com a dura e cruel realidade vivida, principalmente, pelas personagens femininas, em particular por Alba — confesso que sofri ao ler as últimas páginas.

Susana Barão


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